Modernidade
15.junho.2002

Há quanto tempo você 'descobriu' a Internet? Quatro anos? Cinco? Vocé é do tempo da BBS? Não importa. As perguntas principais são: quantas pessoas você conheceu nesse intervalo? Quantas saíram detrás da tela do seu computador e se transformaram em seres humanos, reais e palpáveis? Algum deles se tornou seu amigo? Faz parte da sua vida? Com quem você ainda mantém contato?

A virtualidade ampliou horizontes: daqui de São Paulo, eu atravesso oceanos em segundos e vou aportar em qualquer ponto do hemisfério. A geografia tem todos os seus muros derrubados, suas pontes cruzadas, estamos sem fronteiras: somos alados.

Cabos, fios, linhas telefônicas: essas são, hoje, as principais 'armas' de contato de que dispomos. "O mundo num click." Soa 'lugar comum' pra você? Pra mim também, mas esse é o 'nosso' lugar comum. E não é mentira: o mundo está, literalmente, ao alcance das mãos — do mouse, pra ser mais direta.

Sentados confortavelmente em nossas casas, xícaras de café/chá/leite por companhia, viajamos, sem sair da cadeira, para qualquer lugar que o desejo impelir. Se a imaginação não tem limites, também não o tem as opções que se abrem em múltiplas escolhas diante de nós. Tudo ficou muito fácil...

Tudo? Mais ou menos. Mudaram as relações, os focos, nossos movimentos. Cartas (de todo tipo) tornaram-se eletrônicas — pode-se 'dizer' desde 'Feliz aniversário' até 'Meus pêsames' por e-mail, sem constrangimento algum. Fazem-se compras sem empurrar carrinhos, pagam-se contas sem enfrentar filas (e preocupar-se com o horário bancário), contratam-se serviços, arruma-se emprego, as principais notícias — e as nem tanto — são divulgadas quase em tempo real e têm-se disponível o maior banco de dados já reunido. Pode-se jogar, transar — ou fazer de conta que — , e diversão não falta: o leque é infinito (até divórcio já pode ser on-line!).

Mas a questão é que nunca estivemos tão sozinhos quanto agora. Temos 'amigos' em qualquer parte do universo e ninguém para conversar ou ir ao cinema. Ninguém para tomar um café — senão do outro lado da tela, igualmente solitário. Nossas vozes ganharam substitutas: as letras carregam o peso da habilidade (ou falta dela) em transcrever expressões e pensamentos — e nunca se quis ou procurou saber escrever como atualmente. Nossa espontaneidade está enrustida — tudo que 'dizemos' é muito mais pensado — , e pode-se criar para si mesmo qualquer personagem — o olho-no-olho é coisa pra depois (se ele houver).

Ficou secundário o que já foi imprescindível: a primeira imagem. Ela nos chega hoje através de uma foto antiga e todos nós fazemos de conta que não dá a menor importância: afinal, evoluímos e estamos aprendendo a amar o interior!

Eu acredito que haja um fundo de verdade nisso — até porque, eu hoje vivo com um homem que conheci através da modernidade virtual e que me 'amou' (e a quem 'amei') primeiro 'literariamente'. Mas eu me questiono sobre a banalização que se ergue sobre esse meio de comunicação que já não é mais novidade e demanda perigo em algumas direções. Uma delas é esse isolamento imperceptível para a maioria de nós, que vem mascarado com a ilusão de que o mundo descansa sob nossos pés e não é mais necessário dar sequer um passo para estar nele: só um click...

Debora Bottcher
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